terça-feira, 11 de outubro de 2011

OUTRA CONTESTAÇÃO AO PADRÃO DE RESPOSTA DO EXAME DE ORDEM DA OAB

QUESTÃO 3
Caio e Tício pretendem celebrar contrato de compra e venda de bem imóvel. Contudo, para consumarem o negócio, constituem previamente a pessoa jurídica Provisória Ltda. formada por eles apenas, tendo por fito única e exclusivamente não fazer incidir o ITBI sobre a operação, com amparo no art.156, §2º, I, da CRFB, que prevê hipótese de imunidade da referida exação sobre o imóvel utilizado na integralização do capital social. Nesse sentido, Caio, originalmente proprietário alienante do bem, integraliza suas quotas na forma do imóvel, e Tício completa o capital social da empresa depositando o montante correspondente ao valor do bem objeto da alienação. Após pouco mais de duas semanas, Caio e Tício dissolvem a sociedade e, como consequência, Caio recebe sua parcela do capital em dinheiro, ao passo que Tício recebe o seu quinhão na forma do imóvel.
Analise a conduta adotada pelos particulares e responda se, e como, poderia a Fazenda Municipal satisfazer seu crédito com relação à situação apresentada, uma vez descoberta a real intenção dos dois agentes. (Valor: 1,25)

O PADRÃO DE RESPOSTA:

Espelho – Tributário – Questão 3
A conduta é abusiva e não terá eficácia em face do Fisco. Representa hipótese de elusão fiscal (ou elisão ineficaz), em que o comportamento do contribuinte não é, a rigor, ilícito, mas adota um formato artificioso, atípico para o ato que está sendo praticado, para obter redução de carga tributária. Caio e Tício constituíram a sociedade com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do ITBI, com o escopo de escapar artificiosamente da tributação. Caso o Fisco venha a perceber a manobra artificiosa adotada, poderia lançar o tributo devido, com a aplicação do artigo 116, parágrafo único, do CTN, que dispõe: “A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.” O Fisco poderá, nesta hipótese, requalificar juridicamente os fatos, para fazer incidir o tributo devido.


Item Pontuação
Hipótese de elusão fiscal (ou elisão ineficaz) 0 / 0,25
Abuso de forma 0 / 0,2
O Fisco municipal pode lançar o ITBI, descoberta a conduta abusiva 0 / 0,4
Aplicação da norma geral de antielisão fiscal – art.116, parágrafo único, do CTN 0 / 0,4

contestação: Em primeiro lugar a prova é para advogado, e apesar de ser analista-tributário da receita federal do Brasil, parece-me que a questão foi elaborada por um agente da administração tributária. Não é pacífico na doutrina a utilização do § Único do art. 116 do CTN sem a lei reguladora dos procedimentos. Com a aprovação do Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória no 66, de 2002, sem as regras procedimentais que regularia a norma geral antielisiva, ficou o debate acerca da possibilidade de aplicação dela. Registram-se opiniões distintas. Alguns sustentam a "eficácia limitada" da regra inserida no art. 116 do CTN, como por exemplo Torres "Parece-nos que fica na dependência de normas federais, estaduais ou municipais de caráter procedimental para que possa ser aplicado." (RICARDO LOBO TORRES. Normas Gerais Antielisivas. Disponível em: http://www.agu.gov.br/ce/cenovo/ce.asp?mnu=3_2&num=999999. Acesso em: 08 dez 2011) . Outros, apontam para a "eficácia contida" da disposição: "[...], O dispositivo em tela é o típico caso de norma de eficácia contida, de aplicabilidade imediata e direta na clássica definição de José Afonso da Silva, que também se aplica aos dispositivos de lei complementar." (RICARDO LODI RIBEIRO. A Elisão Fiscal e a LC nº 104/01. Revista Dialética de Direito Tributário nº 83. Pág. 149).
Ocorrendo divergência de monta, entendo ser um erro a exigência de tal fundamento. Acrescente-se ao fato que a própria Administração tributária Federal realizou no início de agosto um Seminário Nacional sobre Regulamentação da Norma Geral Antielisiva - veja aqui . Se a própria Administração Tributária possui dúvidas poque cobrar o assunto em um exame de ordem?

Há mais. A fundamentação legal para a ação do fisco é o artigo 118 do CTN, com aplicação da interpretação objetiva do fato gerador. Reporto que não há edição da lei que regulamente a norma geral anti-elisiva prevista no artigo 116, § Único do CTN.
veja-se abaixo:
Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se:
I. da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;
II. dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.

“Ementa:... São tributáveis, ex vi do art. 118 do Código Tributário Nacional, as operações ou atividades ilícitas ou imorais, posto a definição legal do fato gerador é interpretada com abstração da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos...” (STJ. REsp 182563/RJ. Rel.: Min. José Arnaldo da Fonseca. 5ª Turma. Decisão: 27/10/98. DJ de 23/11/98, p. 198.).
“Ementa:... III. Para fins da incidência tributária, é irrelevante a capacidade jurídica do ente tributado, basta que seja uma unidade econômica...” (TRF-1ª Região. AC 95.01.35853-4/BA. Rel.: Juíza Vera Carla Cruz (convocada). 4ª Turma. Decisão: 08/10/99. DJ de 17/03/00, p. 173.).

Entendo, portanto, que o item de pontuação deveria ser cancelado, com atribuição dos pontos a todos os candidatos.


Prof. Paulo Mendes

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